O
HOMEM RICO E O MENDIGO LÁZARO - UMA ANÁLISE BÍBLICA À
LUZ DO ANTIGO PENSAMENTO JUDAICO-CRISTÃO
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Introdução
Durante um de seus sermões, Jesus Cristo disse que o homem não pode ser escravo de dois amos, pois “ou há de odiar um e amar o outro, ou se apegará a um e desprezará o outro”. Ao falar isso, ele se referia ao apego exagerado ao dinheiro e à maneira que as pessoas lidam com ele. E completou: “Não podeis ser escravos de Deus e das Riquezas”. Por conta dessas palavras, “os fariseus, que eram amantes do dinheiro” começaram “a escarnecer dele”. Mas Jesus não se intimidou. Depois de expor o coração deles, mencionar a Lei e os profetas, e se referir ao pecado do adultério (Lucas 16:14-18), passou a contar uma história que atingia em cheio aqueles homens que zombaram dele:
Havia certo homem rico que se vestia de púrpura e linho fino e seguia vivendo suntuosamente todos os dias. Mas havia um pedinte de nome Lázaro, cheio de feridas, que se recostava ao seu portão, desejando se alimentar das sobras que caíam da mesa do rico. Além disso, os cães vinham e lambiam suas feridas. Então aconteceu que o mendigo morreu e foi levado pelos anjos para o seio de Abraão. O homem rico também morreu e foi enterrado. E, estando em tormentos, no Hades, ele levantou os olhos e viu Abraão de longe, e Lázaro junto a ele.
Então, ele gritou e disse: “Pai Abraão tenha piedade de mim, e manda que Lázaro mergulhe a ponta do seu dedo na água e refresque a minha língua, pois estou atormentado nessas chamas”. Mas Abraão disse: “Filho, lembre-se que durante a sua vida você recebeu suas boas coisas, e Lázaro, por sua vez, as coisas ruins; mas agora ele está confortado e você em tormentos. Além do mais, existe um grande precipício entre nós e vocês, de maneira que aqueles que querem passar daqui para aí não podem, nem podem os daí passar para cá”.
Então, ele disse: “Sendo assim eu imploro, pai, que o envie à casa do meu pai, pois eu tenho cinco irmãos, a fim de que ele possa informá-los, para não virem a este lugar de tormento”. Abraão disse a ele: “Eles têm Moisés e os profetas; que escutem a estes”. E ele disse: “Não assim, pai Abraão, pois se alguém dentre os mortos for até eles, eles se arrependerão”. Mas Abraão disse a ele: “Se eles não escutam Moisés e os profetas, tampouco serão persuadidos se alguém se levantar dentre os mortos”.
Lucas 16: 19-31, New King James Version
Alguns dizem que o relato acima é uma parábola, ou ilustração, ao passo que outros afirmam que é uma história real, pois o evangelista não prefaciou o discurso com as costumeiras palavras: “E ele passou a contar a seguinte parábola...” Qual é o ponto de vista correto?
Lázaro
e o rico Epulão, "Viaje Dela Terra Sancta"(1498)
A Bíblia utilizada na presente consideração é a Tradução do Novo Mundo das Escrituras Sagradas, salvo outra indicação.
Nota Prévia: Publicações teológicas geralmente afirmam que a punição dos maus será o sofrimento eterno num "inferno de fogo", e chamam de "aniquilacionistas" os que repudiam tal ensino e não acreditam na imortalidade da alma. Mas quando se mencionou aqui o conceito de aniquilacionimo, este foi utilizado com sentido mais restrito, referindo-se apenas à crença de que a pessoa deixa de existir por completo quando morre, não havendo, portanto, uma alma espiritual que sobrevive à morte do corpo biológico, ficando a pessoa fiel na dependência de ser "recriada" por Deus no futuro.
Geralmente, os leitores da Bíblia que não aceitam a possibilidade do relato ser verídico são aqueles de mentalidade aniquilacionista, que não crêem na imortalidade da alma. Então, como eles compreendem o que Jesus falou, se o que ele disse foi justamente algo a respeito do que acontece depois da morte? Além disso, qual era o entendimento dos ouvintes de Jesus? Seus contemporâneos tinham ideia do que ele estava falando?
Na verdade, não há uma regra de que toda parábola tem que ser identificada no início como sendo uma ilustração. No entanto, nos casos onde não houve tal identificação, os relatos podem não ser fictícios. Observe o início da narrativa do rico e Lázaro e compare com outras histórias reais mencionadas na Bíblia:
“Ora, havia certo homem rico que se vestia de púrpura e de linho finíssimo e que, todos os dias, se regalava esplendidamente...” – Lucas 16:19, Almeida.
“Eis que havia certo homem vestido de linho, tendo os quadris cingidos de ouro de Ufaz. E seu corpo era como crisólito, e sua face tinha o aspecto do relâmpago...” – Daniel 10:5, 6.
“Ora, aconteceu que havia certo homem de Ramataim-Zofim, da região montanhosa de Efraim, e seu nome era Elcana...” – 1 Samuel 1:1.
“Aconteceu haver na terra de Uz um homem cujo nome era Jó.” – Jó 1:1.
“Entrementes aconteceu que havia certo homem de Zorá...” – Juízes 13:2.
E assim por diante... Portanto, a linguagem tende a indicar que aquele homem rico e Lázaro realmente existiram, e que eles não são apenas personagens imaginários de uma ilustração.
De fato, histórias a exemplo do filho pródigo e do bom samaritano, que também não foram identificadas quais ilustrações, podem realmente ter acontecido, não apenas pela linguagem introdutória, mas por Jesus, em sua vida pré-humana, ter certamente observado muitas situações reais vividas por pessoas, especialmente na nação de Israel, e possivelmente ter podido lembrar-se delas e usar tais experiências para ensinar o povo. – João 8:21-30; Provérbios 8:22-31.
Já nos casos onde se identificou claramente o que ele disse como sendo ilustrações, observam-se diversas comparações, a exemplo do reino de Deus ser como um grão de mostarda, os discípulos semelhantes ao trigo, o solo que nem o coração etc. “É por isso que o reino dos céus se tem tornado semelhante a um homem, um rei...” Tais descrições comparativas não aparecem explicitamente nos relatos do bom samaritano, do filho pródigo, do rico e Lázaro, e de outros. Além disso, depois que contava parábolas às multidões, Jesus se reunia em particular com seus discípulos para explicar o significado delas. As demais pessoas não entendiam as parábolas porque esse esclarecimento não era dado a elas. Nas outras histórias que Jesus contava, porém, não havia necessidade de explicação, pois a lição apresentada era clara em si mesma. – Mateus 13:24-35, 18:23; Lucas 8:9, 10.
Também é importante lembrar que mesmo naquelas narrativas que eram claramente parábolas, Jesus nunca usou fábulas na construção de seu argumento. Ele lançava mão de situações da vida real, de coisas que aconteciam no cotidiano. Não há motivos para achar que a história do rico e Lázaro seja a única exceção, só porque fala do além-túmulo.
De qualquer maneira, mesmo que a narrativa do rico e o mendigo Lázaro seja uma ilustração, não anula a lição que ela contém, a respeito do que acontece ao justo e ao iniquo* depois da morte de ambos. Afinal, é disso que essa “parábola” está falando, não é mesmo? E já que é assim, se o Hades (ou Seol) fosse o símbolo de absoluta inatividade, conforme defendem os aniquilacionistas, como ele poderia representar atividades conscientes, de recompensa e sofrimento? Que orador aniquilacionista em sã consciência faria uma ilustração dessas?
* Naturalmente, o rico não foi para as chamas do Hades por ter sido rico enquanto estava na Terra, pois o próprio Abraão fora também um homem rico e estava em um lugar tranquilo. A verdadeira razão foi omitida, porém, é razoável concluir que o rico praticou pecados graves que justificaram seu destino, a exemplo daqueles que Jesus mencionou imediatamente antes de iniciar o seu relato. – Eclesiastes 7:11, 12; Lucas 16:14-18.
O pensamento judaico às vésperas do Novo Testamento
Para compreender o que Jesus Cristo falou, é preciso primeiramente considerar o que seus contemporâneos judeus realmente pensavam sobre o assunto. Conforme um exame histórico pode demonstrar, os judeus, em geral, sabiam o que significavam os elementos mencionados por Jesus na Parábola do rico e Lázaro, pois eram de conhecimento comum.
No tempo dos primeiros cristãos, a Bíblia não existia da forma que é conhecida hoje. Quando Jesus iniciou seu ministério demoraria décadas para o Novo Testamento surgir, e o cânon das Escrituras Hebraicas (Antigo Testamento) ainda não tinha sido decidido. Por esses motivos, os cristãos também consideravam como “Palavra de Deus” outros manuscritos além dos 39 livros que aceitamos hoje em dia, ou 45, de acordo com a Bíblia católica. Tais livros extra-bíblicos datam de antes do período cristão. Leia a seguir o que alguns deles dizem a respeito do que acontece depois da morte, e note a similaridade dessas citações com algumas passagens do Novo Testamento (destacadas em amarelo):
1. “Eles que acreditam que não morrem para Deus, assim como nossos pais Abraão, Isaque e Jacó não morreram para Deus, eles vivem para Deus”. – 4 Macabeus 7:19; The Old Testament Pseudepigrapha, J. H. Charlesworth, Doubleday, 1983, Apêndice, p. 9.
“Mas, que os mortos são levantados, até mesmo Moisés expôs, no relato sobre o espinheiro, quando ele chama Jeová ‘o Deus de Abraão, e o Deus de Isaque, e o Deus de Jacó’. Ele é Deus, não de mortos, mas de viventes, pois, para ele, todos estes vivem”. – Lucas 20:37, 38.
“Mas agora [Abraão, Isaque, Jacó e outros] procuram alcançar um lugar melhor, isto é, um pertencente ao céu. Por isso, Deus não se envergonha deles, de ser chamado seu Deus”. – Hebreus 11:16, colchetes acrescentados.
2. “Que não haja temor naquele que acha que pode ser morto.... Pois se sofrermos [a morte], Abraão, e Isaque, e Jacó nos receberão, e todos os nossos pais nos elogiarão”. – 4 Macabeus 13:14, 17, The Old Testament Pseudepigrapha, J. H. Charlesworth, Doubleday, 1983, Apêndice, pp. 14, 15, colchetes acrescentados.
“Mas, eu vos digo que muitos virão das regiões orientais e das regiões ocidentais e se recostarão à mesa junto com Abraão, Isaque e Jacó, no reino dos céus”. – Mateus 8:11.
3. “As almas dos justos estão na mão de Deus, e nenhum tormento os tocará. Aparentemente, estão mortos aos olhos dos insensatos, a sua saída deste mundo é considerada uma desgraça, a sua morte como uma destruição: mas eles estão em paz.... sua esperança está cheia de imortalidade”. – Sabedoria 3:1-3, 10, Missionários Capuchinhos.
“Aquilo que semeias não é vivificado a menos que primeiro morra…. Semeia-se corpo físico, é levantado corpo espiritual.... Pois isto que é corruptível tem de revestir-se de incorrupção e isto que é mortal tem de revestir-se de imortalidade”. – 1 Coríntios 15:36, 44, 53.
“Além disso, irmão entregará irmão à morte, e o pai ao seu filho, e os filhos se levantarão contra os pais e os farão matar. E vós sereis pessoas odiadas por todos, por causa do meu nome.... O que eu vos digo na escuridão, dizei na luz; e o que ouvis sussurrando, pregai dos altos das casas. E não fiqueis temerosos dos que matam o corpo, mas não podem matar a alma”. – Mateus 10:27, 28.
“E eu vi tronos, e havia os que se assentavam neles, e foi-lhes dado poder para julgar. Sim, vi as almas dos executados com o machado, pelo testemunho que deram de Jesus e por terem falado a respeito de Deus”. – Apocalipse 20:4.
4. “Naqueles dias os anjos descerão aos lugares de esconderijo, e reunirão em um lugar todos os que tem ajudado no crime.... Ai de vós, pecadores; pois com as palavras de vossas bocas, e com a obra de vossas mãos, tendes agido impiamente; na chama de um fogo ardente sereis queimados.... Quando suas almas descerem ao receptáculo dos mortos [Seol], suas más obras se tornarão seu grande tormento.... e em chama que queimará até o grande julgamento”. – 1 Enoque 21:5; 99:1, 7; 103:4, 5, colchetes acrescentados (*).
“O Filho do homem enviará os seus anjos, e estes reunirão dentre o seu reino todas as coisas que causam tropeço e os que fazem o que é contra a lei, e lançá-los-ão na fornalha ardente. Ali é que haverá o seu choro e o ranger de seus dentes”. – Mateus 13:41, 42.
“Ora, a língua é um fogo. A língua constitui um mundo de injustiça entre os nossos membros, pois mancha todo o corpo e incendeia a roda da vida natural, e é incendiada pela Geena”. – Tiago 3:6.
“Se, pois, a tua mão ou o teu pé te faz tropeçar, corta-o e lança-o para longe de ti; é melhor para ti entrares na vida aleijado ou coxo, do que seres lançado com duas mãos ou dois pés no fogo eterno”. – Mateus 18:8.
* A tradução do livro de Enoque que foi aqui utilizada é de Elson C. Ferreira, de 2003 (Curitiba, Brasil).
5. “Então Rafael, um dos santos anjos que estava comigo, respondeu e disse: ‘Estes são os lugares deleitosos onde os espíritos, as almas dos mortos, serão reunidos.... Estes lugares, nos quais habitam, eles ocuparão até o dia do julgamento, e até seu período escolhido. Seu período escolhido será longo, mesmo até o grande julgamento’. E vi os espíritos dos filhos dos homens que estão mortos; e suas vozes rompem o céu.... Então inquiri de Rafael, o anjo que estava comigo, e disse: ‘Que espírito é aquele, cuja voz alcança o céu, e acusa?’ Ele respondeu, dizendo: ‘Este é o espírito de Abel o qual foi morto por Caim’.... Eu inquiri a respeito dele, e a respeito do julgamento geral, dizendo: ‘Por que um está separado ou outro?’ Ele respondeu: ‘Três separações foram feitas entre os espíritos dos mortos, e assim os espíritos dos justos foram separados.... E da mesma maneira os pecadores são separados quando morrem, e são sepultados na terra.... Aqui suas almas estão separadas. Além disso, abundante é seu sofrimento até o tempo do grande julgamento.... Assim, existe uma separação entre as almas daqueles que proferem reclamações, e daqueles que vigiam pela sua destruição’. ”. – 1 Enoque 22:1-9.
“E quando abriu o quinto selo, vi por baixo do altar as almas dos que tinham sido mortos por causa da palavra de Deus e por causa da obra de testemunho que costumavam ter. E gritaram com voz alta, dizendo: ‘Até quando, Soberano Senhor, santo e verdadeiro, abster-te-ás de julgar e vingar o nosso sangue dos que moram na terra?’ ”. – Apocalipse 6:9,10.
“O rei dirá então aos à sua direita: ‘Vinde, vós os que tendes sido abençoados por meu Pai, herdai o reino preparado para vós desde a fundação do mundo.... Então dirá, por sua vez, aos à sua esquerda: ‘Afastai-vos de mim, vós os que tendes sido amaldiçoados, para o fogo eterno”. – Mateus 25:34, 41.
6. “[E o anjo diz a Abraão:] A paz esteja contigo, ó justa alma, amigo do Altíssimo, aquele que recebeu os santos anjos quais convidados, sob seu teto hospitaleiro!... [E Deus diz aos anjos:] Levem o meu amigo Abraão ao Paraíso, à morada dos meus justos, as residências dos meus santos, onde não há nem trabalho, nem luto, nem pesar, mas sim paz, e alegria, e vida sem fim”. – A Hagadá Pré-Talmúdica, The Jewish Quarterly Review, Vol. 7, No. 4 (Jul., 1895), pp. 589, 591, colchetes acrescentados.
7. O “Seio de Abraão” fica no paraíso para onde ele foi, onde há uma vida de contentamento, e “a fórmula no seio de Abraão, Isaque e Jacó, nossos pais” aparece em manuscritos judaicos “desde o segundo século a.C. até o terceiro século d.C.”, conforme é visto em 4 Macabeus, no capítulo 13. – Ibid., pp. 591, 594.
“[Pouco antes de morrer] Jesus lhe respondeu [ao criminoso arrependido]: ‘Eu lhe garanto: Hoje você estará comigo no paraíso”. – Lucas 23: 42, 43, Nova Versão Internacional (NVI), colchetes acrescentados.
“Àquele que vencer concederei comer da árvore da vida, que está no paraíso de Deus". – Apocalipse 2:7.
As sete citações acima mostram todos os elementos principais do relato do rico e Lázaro, quais sejam: (1) que Abraão continua vivo em outro lugar, (2) que após a morte, o justo é levado pelos anjos para onde Abraão está, onde desfruta de paz e alegria, (3) esse lugar paradísico é chamado de “seio de Abraão”, (4) o ímpio tem um destino diferente, pois fica preso em uma parte onde há grande sofrimento, até o dia do julgamento, (5) ambos os locais estão numa mesma região espiritual, e, por essa razão, (6) é possível haver comunicação entre os que estão nos dois setores, (7) ainda que estejam separados por um grande “abismo”. (Teólogos atuais, com base em Efésios 4:7-10, dizem que o Seio de Abraão foi transferido para o céu depois da ressurreição de Jesus).
Observação: A palavra hebraica “Seol” equivale à palavra grega “Hades”, e ambas se referem ao lugar para onde vão as almas dos que morreram. Algumas Bíblias traduzem por “inferno”, quando aparecem em referência à morte dos ímpios. Para mais informações consulte o artigo Seol, ou Hades, e Conceitos Relacionados. – Salmos 16:10; Atos 2:27.
O “seio” de Abraão tem a ver com a hospitalidade que ele demonstra ao receber convidados, junto a uma mesa farta, exatamente como fazia quando estava na Terra (Hebreus 13:2). É um conceito próximo de “regaço”, descrito em 2 Samuel 12:8 e Lucas 6:38, e do ‘recostar ao peito’ de alguém durante uma refeição amigável, conforme João 13:25. Isto é significativo porque, ao contrário do rico Epulão, Lázaro não costumava ter essa alegria quando vivia na carne, mas ao chegar ao Seio de Abraão passou a desfrutar dessa benesse.
Portanto, conforme indica a literatura da época, a crença na imortalidade da alma era um conceito predominante entre os judeus do século I. É impossível entender a Parábola do rico e Lázaro desconsiderando esse fato. Veja informações adicionais veja o artigo Manuscritos Judaicos Pré-Cristãos.
Na verdade, conforme foi visto na comparação entre textos bíblicos e fontes extra-bíblicas, nem é preciso consultar estas últimas para perceber o conceito que os cristãos primitivos tinham a respeito de alma e espírito. Ou seja, a própria Bíblia contém as informações necessárias para o entendimento correto. A crença na sobrevivência da alma e do espírito depois da morte não foi muito enfatizada nas Escrituras porque já era de amplo conhecimento e seria desnecessário ficar falando sobre isso (não somente entre os judeus, mas em todo o mundo helenístico). Mas quando aspectos relacionados à imortalidade da alma e do espírito surgem no Novo Testamento estão sempre de acordo com outros escritos em voga à época de Jesus. Considere mais um exemplo:
“Mas tendes chegado ao monte Sião e à cidade do Deus vivo, a Jerusalém celestial, e a incontável hostes de anjos, e à universal assembléia e igreja dos primogênitos arrolados nos céus, e a Deus, o Juiz de todos, e aos espíritos dos justos aperfeiçoados”. – Hebreus 12:22-24, Almeida.
Ao se listar quem foi mencionado no texto, percebe-se que todos são pessoas: Deus, Jesus, Anjos, primogênitos e os espíritos dos justos (que viveram na carne e foram aperfeiçoados, conforme descrito em Hebreus 5:7-10). Dentre esses justos certamente estão Abraão, Isaque e Jacó, aqueles que receberiam convidados à mesa deles nos próprios céus (Mateus 8:11). Mas eles só poderiam recebê-los se já vivessem lá antes, o que está de acordo com aquilo que Jesus falou:
“Ele é Deus, não de mortos, mas de viventes, pois, para ele, todos estes vivem [Abraão, Isaque e Jacó]. Em resposta, alguns dos escribas disseram: ‘Instrutor, falaste bem’.”. – Lucas 20:37-39.
Possivelmente, alguns escribas elogiaram as palavras de Jesus justamente porque também acreditavam que Abraão, Isaque e Jacó continuavam vivos em outro lugar. Esta esperança já havia sido mencionada nas Escrituras Hebraicas:
“E depois que o meu corpo estiver destruído e sem carne, verei a Deus. Eu o verei com os meus próprios olhos; eu mesmo, e não outro!” – Jó 19:26, 27, NVI; conforme Mateus 5:8.
“O perverso é destruído por seus próprios pecados, mas o justo tem esperança de uma vida melhor depois da morte”. – Provérbios 14:32, A Bíblia Viva.
“[E Abigail disse a Davi:] Se alguém te perseguir ou conspirar contra a tua vida, a alma do meu senhor permanecerá entre os vivos junto do Senhor, teu Deus, enquanto a vida dos teus inimigos será agitada e lançada para longe, como a pedra de uma funda”. – 1 Samuel 25:29, Missionários Capuchinhos, colchetes acrescentados.
Parafraseando o que Pedro disse, Abraão, Isaque e Jacó morreram somente “quanto à carne, do ponto de vista dos homens”, mas continuam vivos “quanto ao espírito, do ponto de vista de Deus.” – 1 Pedro 4:4-6.
Os cristãos que não acreditam na vida após a morte
A esta altura, cabe perguntar:
O que os aniquilacionistas fazem para se sobressair do peso de toda evidência que existe contra o conceito deles, de que a alma e o espírito desaparecem com a morte do corpo biológico?
As “Testemunhas de Jeová” (TJs) são, talvez, o maior grupo religioso que existe com crença aniquilacionista e o tratamento que elas dão à questão pode exemplificar muito bem até que ponto algumas pessoas chegam para fugir daquilo descrito na história do rico e Lázaro. As TJs possuem sua própria tradução da Bíblia, chamada de “Tradução do Novo Mundo das Escrituras Sagradas” (TNM), publicada pela Torre de Vigia. Seus editores afirmam que a TNM é uma tradução literal, tanto quanto possível. No entanto, eles fazem uma ressalva:
“Houve desvios ocasionais do texto literal com o fim de transmitir, em termos inteligíveis, as difíceis expressões idiomáticas do hebraico ou do grego”. – Toda Escritura é Inspirada por Deus e Proveitosa (1990), p. 326, publicado pela Torre de Vigia.
Mas será mesmo que eles não traduziram literalmente alguns versículos apenas quando não era possível, devido às dificuldades do hebraico e do grego?
Note como o texto de Hebreus 12:22-24 está na TNM:
“Mas, vós vos chegastes a um Monte Sião e a uma cidade do Deus vivente, a Jerusalém celestial, e a miríades de anjos, em assembléia geral, e à congregação dos primogênitos que foram alistados nos céus, e a Deus, o Juiz de todos, e às vidas espirituais dos justos que foram aperfeiçoados, e a Jesus, o mediador dum novo pacto”.
Foi visto antes, em outra versão da Bíblia, que os espíritos dos justos que foram aperfeiçoados é que recebem os cristãos que vão para o céu, conforme Jesus fez alusão em Mateus 8:11. No entanto, ao invés de dizer "espíritos", a TNM verte por "vidas espirituais". Mas não é isto o que diz o texto grego original. Lá realmente consta "espíritos dos justos". Que os tradutores da TNM sabem que a tradução que fizeram está errada pode ser constatado na versão grego-inglês que eles mesmos publicaram, chamada “Tradução Interlinear do Reino”, que contém uma tradução literal palavra por palavra do grego para o inglês:
Conforme pode ser visto, o versículo não diz “vidas espirituais”, mas sim “espíritos”, conforme está em todas as outras versões facilmente acessíveis:
“Os espíritos daquelas boas pessoas que foram aperfeiçoadas.” – Contemporary English Version.
“Dos espíritos dos justos que chegaram à perfeição.” – TEB.
“Dos espíritos justos que chegaram à meta final.” – Edição Pastoral.
“Aos espíritos dos que são corretos e que se tornaram perfeitos.” – A Bíblia na Linguagem de Hoje.
Etc.
Ao que parece, os tradutores optaram por essa tradução espúria para dar suporte a uma releitura não autorizada do texto, e para que seus leitores não fossem induzidos a acreditar naquilo que os cristãos já acreditam desde o primeiro século, isto é, que a alma e o espírito sobrevivem à morte. – Mateus 10:28; 1 Pedro 3:18.
A TNM usa uma “técnica” semelhante em Hebreus 12:9, trocando “Pai dos espíritos para vivermos” por “Pai da nossa vida espiritual”:
“Além do que, tivemos nossos pais segundo a carne, para nos corrigirem, e nós os reverenciamos; não nos sujeitaremos muito mais ao Pai dos espíritos para vivermos?” – Almeida Fiel.
Se Deus é Espírito, é coerente supor que seus filhos sejam também espíritos. (Compare com João 3:1-8 e 4:24). É lamentável ver que existe na TNM uma tendência de obscurecer essa verdade na mente de seus leitores, o máximo que é possível. Em Apocalipse 22:6, ao invés de dizer “o Deus dos espíritos dos profetas”, a TNM diz “o Deus das expressões inspiradas dos profetas”. Em 1 João 4:1, ao invés de dizer “não deis crédito a qualquer espírito” (para examinar se o espírito vem de Deus) a TNM diz “não acrediteis em toda expressão inspirada, mas provai as expressões inspiradas para ver se se originam de Deus”.
Um outro exemplo, este mais sutil, pode ser visto em Provérbios 14:32. De acordo com a TNM, o texto diz assim:
“Por causa da sua maldade, o iníquo será empurrado para baixo, mas o justo achará refúgio na sua integridade.* ”.
No asterisco do final, os editores dizem numa nota ao pé de página o seguinte:
“ * ‘Integridade’, mediante uma ligeira correção do M para concordar com LXXSy; M: ‘morte’.”.
M refere-se ao texto hebraico original, chamado de massorético, do qual a TNM traduziu o Antigo Testamento. LXX e Sy são duas antigas traduções do texto hebreu para o grego e o aramaico, respectivamente.
Então, eles estão dizendo que, mediante uma “ligeira correção”, trocaram intencionalmente a palavra “morte” por “integridade”, para que a tradução ficasse como está na Septuaginta (LXX) e na versão Siríaca (Sy). Por que eles preferiram assim? A razão dessa troca parece bem evidente caso a palavra “morte” seja colocada de volta no versículo:
“Por causa da sua maldade, o iníquo será empurrado para baixo, mas o justo achará refúgio na sua morte”.
Outras versões dizem algo semelhante:
“O ímpio será derrubado por causa de sua malícia; o justo, porém, na morte conserva a confiança”. – Missionários Capuchinhos.
“O ímpio será derrubado por sua maldade, mas o justo terá onde refugiar-se quando morrer”. – Vozes.
“O iníquo é lançado abaixo por sua própria maldade, o justo encontra segurança em sua morte”. – The Jewish Bible (Tanakh).
“O ímpio será derrubado pela sua malícia; o justo, porém, na sua morte conserva a esperança”. – Matos Soares.
“O perverso é destruído por seus próprios pecados, mas o justo tem esperança de uma vida melhor depois da morte”. – A Bíblia Viva.
Conforme está nas Bíblias acima, o texto de Provérbios 14:32 lembra bastante aquilo que foi dito no livro da Sabedoria, disponível aos leitores cristãos antes de haver Novo Testamento:
“As almas dos justos estão na mão de Deus, e nenhum tormento os tocará. Aparentemente, estão mortos aos olhos dos insensatos, a sua saída deste mundo é considerada uma desgraça, a sua morte como uma destruição: mas eles estão em paz.... sua esperança está cheia de imortalidade.... Mas os ímpios terão o castigo, que merecem os seus pensamentos”. – Sabedoria 3:1-3, 10, Missionários Capuchinhos, Bíblia Católica.
Observação: mesmo conservando a palavra “morte”, alguns tradutores dão um entendimento um pouco diferente ao versículo, de que ele estaria se referindo ao justo que se mantém confiante mesmo diante da possibilidade de morrer. Mas isto é claramente uma paráfrase. Numa tradução literal, o texto realmente diz que o justo tem um refúgio garantido depois que morre (no Seol ou Hades). Esse abrigo é aquele lugar chamado de “Seio de Abraão” na Parábola do rico e Lázaro.
Interessante que uma Bíblia cujos direitos autorais pertencem à Torre de Vigia, traduz o texto da seguinte maneira:
“O trapaceiro é derrubado pela perversidade, mas o homem honesto encontra refúgio em sua vida conscienciosa”. – The Bible in Living English, de Steven T. Byíngton.
Percebe-se que Byíngton também fez uma “ligeira correção”, para concordar com sabe-se lá o que... Mas, ao invés de trocar “morte” por “integridade”, ele trocou por “vida conscienciosa”, talvez em alusão a uma vida levada de maneira bem pensada.
Além dos "ajustes" em sua tradução da Bíblia, as "Testemunhas de Jeová" também fazem uso de algumas citações bíblicas para tentar provar seu conceito materialista do aniquilacionismo. Mas uma análise pormenorizada de tais versículos mostra que eles são apenas mal compreendidos pelas TJs e que, na verdade, eles não contradizem a crença na imortalidade da alma e do espírito. Para uma consideração desses textos amiúde mal aplicados, consulte o apêndice A do PDF deste artigo. E para uma consideração mais abrangente do assunto, leia os três textos abaixo indicados:
O que a Bíblia realmente ensina sobre a morte
Obras Teológicas e de Referência Apoiam o Aniquilacionismo?
Sobre o Aniquilacionismo e a Imortalidade da Alma
O pensamento cristão no Novo Testamento
Por isso é que foi dito: “Quando ele [Jesus] subiu em triunfo às alturas, levou cativo muitos prisioneiros, e deu dons aos homens”. (Que significa “ele subiu”, senão que também havia descido às profundezas da terra?”).
E ele pôs a sua mão direita sobre mim e disse: “Não temas. Eu [Jesus] sou o Primeiro e o Último, e o vivente; e fiquei morto, mas, eis que vivo para todo o sempre, e tenho as chaves da morte e do Hades”.
Efésios 4:8, 9 (Nova Versão Internacional) e Apocalipse 1:17-18, colchetes acrescentados
Leia abaixo outros versículos bíblicos com a mesma temática:
“Porque, assim como Jonas esteve três dias e três noites no ventre do enorme peixe, assim estará também o Filho do homem três dias e três noites no coração da terra”. – Mateus 12:40.
“Mas tendes chegado ao monte Sião e à cidade do Deus vivo, a Jerusalém celestial, e a incontável hostes de anjos, e à universal assembléia e igreja dos primogênitos arrolados nos céus, e a Deus, o Juiz de todos, e aos espíritos dos justos aperfeiçoados”. – Hebreus 12:22-24, Almeida.
“Mostra-me favor, ó Jeová; vê a minha tribulação por parte daqueles que me odeiam, ó tu que me ergues dos portões da morte, para que eu declare todos os teus feitos louváveis nos portões da filha de Sião, a fim de que eu jubile na tua salvação”. – Salmos 9:13-14.
“Ó Jeová, fizeste subir a minha alma do próprio Seol, mantiveste-me vivo, para que eu não descesse ao poço”. – Salmos 30:3.
“Ascendeste ao alto, levaste contigo cativos, tomaste dádivas em forma de homens. Sim, mesmo os obstinados, para residir entre eles, ó Jah, Deus”. – Salmos 68:18.
“Porque a tua benevolência é grande para comigo, e livraste a minha alma do Seol, do seu lugar mais baixo”. – Salmos 86:13.
Jesus busca cativos
no Hades: "O Arado no Inferno do Rolo Jubiloso", Codex Barberini Latinus
(1087)
Ao que tudo indica, aqueles subterfúgios mencionados que aparecem na Bíblia das "Testemunhas de Jeová" não têm o intuito de "transmitir, em termos inteligíveis", frases difíceis do grego original, mas sim impedir que seus leitores enxerguem aquilo que a Bíblia realmente diz e fiquem reféns daquilo que a Torre de Vigia ensina. Devido a isso, o leitor de mentalidade aniquilacionista, produzido pela Tradução do Novo Mundo, não consegue perceber o óbvio, ao ler textos como esse a seguir:
“Ele [Jesus] morreu no corpo, mas foi ressuscitado no espírito, e no espírito foi e pregou aos espíritos que estavam presos. Estes eram os espíritos daqueles que não tinham obedecido a Deus, quando ele ficou esperando com paciência nos dias em que Noé estava construindo a barca”, – 1 Pedro 3:18-20, Nova Bíblia na Linguagem de Hoje.
Quem foram esses espíritos? A resposta mais natural a essa pergunta é que foram os espíritos dos que morreram afogados no Dilúvio, os contemporâneos de Noé, o “pregador da justiça”, como dá a entender a versão acima. (Mateus 24:38, 39; 2 Pedro 2:5) É tanto que na sequencia da sua escrita, Pedro fez o seguinte comentário adicional:
“Mas, estas pessoas [as que falam mal dos cristãos] prestarão contas àquele que está pronto para julgar os viventes e os mortos. De fato, com este objetivo se declararam as boas novas também aos mortos, para que fossem julgados quanto à carne, do ponto de vista dos homens, mas vivessem quanto ao espírito, do ponto de vista de Deus”. – 1 Pedro 4:4-6, colchetes acrescentados.
Embora exista na Bíblia uma aplicação da palavra “mortos” em sentido figurado (Lucas 9:60; Romanos 7:4), este não parece ser o caso na carta de Pedro, devido ao contexto do que ele vinha falando (espíritos dos desobedientes / pregar aos espíritos desobedientes da época de Noé / julgamento dos vivos e dos mortos / declarar as boas novas aos mortos).
Que os cristãos do primeiro século tinham um conceito semelhante à crença da maioria dos cristãos de hoje pode ser percebido até em versículos que não foram escritos com o intuito de esclarecer esse ponto. Por exemplo, quando Jesus Cristo andou sobre as águas, durante uma tempestade, e seus discípulos viram aquela figura humana se aproximando, eles reagiram da seguinte maneira:
“E os discípulos, vendo-o andando sobre o mar, assustaram-se, dizendo: ‘É um fantasma!’ E gritaram com medo”. – Mateus 14:26, Almeida.
A TNM, ao invés de traduzir por "fantasma", traduz por "aparição", talvez para amenizar o sentido da palavra, que em grego é justamente phantasma, semelhante ao termo em português. Todos sabem que o sentido que as pessoas dão ao vocábulo “fantasma” é de alguém que voltou do mundo dos mortos.
O mesmo aconteceu quando o ressuscitado Jesus apareceu repentinamente para seus discípulos. Sobre esse episódio, a Bíblia diz:
“Mas, visto que estavam apavorados e tinham ficado amedrontados, imaginavam ver um espírito”. – Lucas 24:37.
Conclusão
Pois bem, voltando à história do rico e de Lázaro, qual é a explicação que as “Testemunhas de Jeová” dão para ela, já que não acreditam na vida após a morte? Veja abaixo:
“O rico, na ilustração, representava os líderes religiosos que se julgavam importantes, os quais rejeitaram a Jesus e depois o mataram. Lázaro retratava o povo comum, que aceitou o Filho de Deus. A morte do rico e de Lázaro representava uma mudança de condição. Esta mudança ocorreu quando Jesus alimentou espiritualmente o povo que fora negligenciado e que era como Lázaro, de modo que esse obteve o favor do Abraão Maior, Jeová Deus. Ao mesmo tempo, os líderes religiosos, falsos, ‘morreram’ quanto a terem o favor de Deus. Sendo rejeitados, sofreram tormentos quando os seguidores de Cristo expuseram as obras más deles”. – Poderá Viver para Sempre no Paraíso na Terra, pp. 88, 89.
Tendo em mente todas as evidências bíblicas aqui apresentadas, você acha que a interpretação acima é aceitável? Incrivelmente, as mesmas pessoas que publicaram essa “explicação” disseram também o seguinte:
“Um segundo obstáculo ao entendimento [das parábolas] é fazer uma aplicação minuciosa demais da ilustração, tentando fazer com que cada pormenor da narrativa dos eventos literais se enquadre simbolicamente, por meio de aplicação ou interpretação arbitrárias”. – Estudo Perspicaz das Escrituras, volume 2, p. 373, colchetes acrescentados.
Levando em consideração o rico panorama da época de Jesus e aquilo que o motivou a dizer aquelas palavras, a aplicação que a Torre de Vigia faz da história do rico e Lázaro deve ser prontamente descartada, além do que sua interpretação pode ser avaliada de acordo com a própria crítica que foi publicada obra “Estudo Perspicaz”.
Toda evidência bíblica disponível, que foi aqui examinada, encaminha o leitor da Bíblia para o entendimento de que os cristãos que escreveram o Novo Testamento acreditavam que o espírito e a alma continuam a existir depois da morte do corpo biológico, exatamente como está em alguns manuscritos judaicos extra-bíblicos. É por isso que eles não tiveram nenhum problema para compreender o que foi descrito no relato do rico e Lázaro. Da mesma maneira, aqueles amantes do dinheiro que foram criticados por Jesus devem ter entendido perfeitamente o que ele disse, já que eram letrados e muito provavelmente conheciam as obras judaicas a que Jesus fez referência na Parábola. Mas, naturalmente, a mensagem não foi apenas para eles, pois outras pessoas se beneficiariam do relato, por este conter uma importante lição.
Qual foi então a lição que Jesus quis ensinar mediante a história do homem rico e o mendigo Lázaro? Não é preciso conjecturas mirabolantes. Tendo em mente a crença dos ouvintes, a moral da história é que não devemos praticar ações reprovadas por Deus, a exemplo da arrogância, da falta de bondade, e do amor ao dinheiro, pois aquilo que for feito hoje na carne terá repercussões no futuro, no espírito. – Provérbios 21:4; Mateus 18:23-35; 1 Timóteo 6:10; 1 Pedro 4:4-6.
“Armazenai para vós tesouros no céu, onde nem a traça nem a ferrugem consomem, e onde ladrões não arrombam nem furtam. Pois, onde estiver o teu tesouro, ali estará também o teu coração”. – Mateus 6:20, 21.
“A sabedoria é tão boa quanto o patrimônio: é de proveito àqueles que vêem o sol; estar sob o abrigo da sabedoria é como estar sob o abrigo do dinheiro, mas é vantagem conhecer a sabedoria, pois ela preserva a vida de quem a possui”. – Eclesiastes 7:11, 12, Vozes.
“Estas seis coisas o SENHOR odeia, e a sétima ele abomina: olhos altivos, língua mentirosa, mãos que derramam sangue inocente, o coração que maquina pensamentos perversos, pés que se apressam a correr para o mal, a testemunha falsa que profere mentiras, e o que semeia contenda entre irmãos”. – Provérbios 6:17-19, Almeida Fiel.
“Cada um de nós prestará contas de si mesmo a Deus”. – Romanos 14:12.
"Porque o Filho do homem está destinado a vir na glória de seu Pai, com os seus anjos, e então recompensará a cada um segundo o seu comportamento”. – Mateus 16:27.
“Assim a bondade e a mercê me acompanham, em todos os dias de minha vida; e eu assistirei na casa de IAHVÉH para sempre”. – Salmos 23:6, Santos Saraiva.
“O rei dirá então aos à sua direita: ‘Vinde, vós os que tendes sido abençoados por meu Pai, herdai o reino preparado para vós desde a fundação do mundo.... Então dirá, por sua vez, aos à sua esquerda: ‘Afastai-vos de mim, vós os que tendes sido amaldiçoados, para o fogo eterno.” – Mateus 25:34, 41.
"Pus diante de ti a vida e a morte, a bênção e a invocação do mal; e tens de escolher a vida para ficar vivo." – Deuteronômio 30:19
CRÉDITOS DAS IMAGENS UTILIZADAS:
1. Lázaro e o rico Epulão:
Xilogravura que aparece na estampa nº 15 (f. 66 a) da obra "Viaje Dela Terra Sancta", de Bernardus de Breidenbach (Saragoça, 1498), comentada em um artigo do periódico CEM Nº 1, Cultura, Espaço e Memória, do Centro de Investigação Transdisciplinar, p. 243.
2. Trecho em grego e inglês de Hebreus:
Tradução Interlinear do Reino (1969), publicada pela Torre de Vigia.
3. Jesus buscando cativos no Hades:
“The Harrowing of Hell from the Exulted Roll: Codex Barberini Latinus 592. (f. 4), ca. 1087”, conforme aparece na obra “The Apocalypse of Abraham: An Ancient Witness for the Book of Moses” (2010), de Jeffrey Bradshaw e David Larsen, p. 19.
4. Jesus andando sobre as águas:
A Bíblia em Quadros (1987), Editora Mundo Cristão.
5. Jesus aparecendo aos discípulos
6. Chamas do Hades e Seio de Abraão separados por um abismo
(clique na imagem
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Observação: O texto do folheto acima foi desmembrado para formar alguns artigos do meu website. Tais versões online contam com algumas atualizações que ainda não estão presentes no PDF, a exemplo da seção Manuscritos Judaicos Pré-Cristãos.
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Textos adicionais recomendados para um aprofundamento do tema:
O que ensinaram os escritores cristãos do segundo século?
A filosofia grega influenciou mesmo o conceito do Cristianismo sobre imortalidade?